sábado, 22 de dezembro de 2012

ANGELITA E O ADAGIO DE ALBINONI




Há alguns anos atras, fui convidado para uma recepção na casa de um amigo frances em homenagém a seus pais recém chegados da Europa para visita-lo.

A certa altura da conversa que se desenrolava bastante animada sobre musica erudita, sem nada dizer, pedi ao musico para tocar ao piano o Adagio de Albinoni. Logo nos primeiros acordes percebi  um brilho diferente nos olhos da mãe do anfitrião, senhora, à época, quase nonagenaria.

Seu nome, Marguerite Betini, ouviu toda a peça em silencio com olhar perdido no vazio e no rosto a expreção da serenidade. Ao final da musica me agradeceu e perguntou se seu filho havia cobinado comigo para lhe fazer aquela surpresa, pois tal musica tinha para si um sentido bastante profundo.  E me disse então: Vou lhe contar!

Durante a ocupação nazista na França, Marguerite, à essa época uma jovem  e bela dançarina de balet, apresentava em um teatro local uma peça que tinha como tema o Adagio de Albinoni. No meio da apresentação o teatro foi invadido por oficiais nazistas e policiais franceses do governo colaboracionista de Vichi. Foram todos presos e levados de Toulouse, sua cidade natal, para Lion onde estava instalado  o campo de concentração da França ocupada.

Foi jogada em uma cela  juntamente com outras trinta pessoas que sussurravam baixinho, pois sabiam que de algum lugar alguem os espionava intentando a obtenção de informações. De repente ouviram musica de gramofone. Era o Adagio de Albinoni. Todos ficaram em silencio escutando os acordes pungentes da bela canção, era um silencio reverente e mesclado de medo. Marguerite nada entendeu.

Apos o fim da melodia, apareceu diante da cela um jovem oficial SS elegantemente vestido em seu dolman negro, ostentando além de sua beleza ariana, a caveira e a suastica. Todos permaneceram em silencio com o terror estampado em seus rostos, se ouviam soluços aqui e ali entrecortados de preces.

Uma jovem e bela judia foi arrancada brutalmente da cela e levada por dois soldados que o escoltavam. Se ouviu novamente o Adagio, dessa feita, acompanhado de gritos de dor.

Os prisioneiros que já estavam la a mais tempo, lhe explicaram que sempre antes das sessões de tortura, estupros e outras vilezas, o monstro ouvia o Adagio de Albinoni.

Muitos  dos prisioneiros estavam bastante combalidos em razão dos maus tratos, da idade avançada e da ma qualidade da alimentação, o que levou Marguerite a dedicar seu tempo a oferecer-lhes cuidados que lhes amenizasse o sofrimento. Os mais jovens tomavam apenas a sopa rala e fétida e escondiam as codeas de pão para dar aos mais velhos a noite. Quando muito tiravam para si apenas um pedaço de pão que amassavam atê se tornar uma bola rigida que colocam sob a lingua, onde deixavam dissolver lentamente. Era um modo curioso de enganar a fome.

Em razão de seu espirito alegre e inquebrantavel e do carinho que dispensava aos outros prisioneiros, uma velha judia espanhola lhe apelidou de ANGELITA, pequeno anjo em espanhol. Nome com que Marguerite se apresentou ao nos conhecermos e que passou a adotar apos a libertaçao pelas tropas aliadas.

Angelita, não era judia, fora presa por fazer parte da resitencia francesa, pelo que foi brutalmente torturada. No carcere conheceu um jovem resistente, aquele que viria a ser o seu companheiro de toda a vida, o pai de seu filho.

Lhe perguntei a razão de tanta alegria depois de tudo que sofrera, ao que respondeu que, primeiramente, havia sobrevivido e la conhecera seu marido, que as torturas lhe ensinaram a conhecer seus limites, a levaram ao auto conhecimento, pois so aprendemos isso quando somos verdadeiramente colocados à prova, e principalmente aprendera a conhecer a natureza humana, o quanto de maldade poderia se esconder atras de um belo rosto, como o daquele jovem oficial. E disse com um sorriso radiante: E mais, ouviamos o Adagio todos os dias.

Angelita, não obstante seus quase noventa anos, tinha limpidos olhos azuis de adolescente que sorriam junto com seus labios. Era uma criatura apaixonante, daquelas que se fazem notar apenas com sua simples presença.

Angelita me disse então que perguntara, pro forma, seu eu havia combinado a surpresa com seu filho, pois sabia que tal não se dera, vez que o Adagio sempre estivera ligado aos eventos mais importantes de sua vida.

Esta manhã bem cedo, meu vizinho escutava o Adagio de Albinoni, não pude deixar de lembrar de Angelita. Onde estara, posto que jâ não esta mais entre nos. Se existe o paraiso idealizado pelas religiões, Angelita deve estar la em um lugar de honra, aqueles reservados aos anjos.
By Douglas Martinez.

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